Conhecendo os argumentos falaciosos: Falácias indutivas

Elas estão em toda parte e usam dados incompletos ou descontextualizados para confundir.
Elas estão em toda parte e usam dados incompletos ou descontextualizados para confundir.

Muito comum na imprensa as falácias indutivas usam dados parciais, pedaços de informação selecionados a dedo, comparações tendenciosas e outros métodos para provar ou refutar conclusões.

Segundo Stephen Downes "o objetivo de um argumento é expor as razões que sustentam uma conclusão. Um argumento é falacioso quando parece que as razões apresentadas sustentam a conclusão, mas na realidade não sustentam".

Com este artigo damos sequência a série dedicada às falácias e argumentação, cujo primeiro artigo tratamos das falácias do tipo fugindo ao assunto.

Em um mundo recheado de pós-verdade e muito pouca reflexão o estudo, ou pelo menos a mínima compreensão, das falácias a que estamos expostos todos os dias é de suma importância. Compreender os erros e induções contidas nas frases que ouvimos todos os dias em todos os lugares nos ajudarão a aumentar nosso senso crítico, evitar cair em armadilhas que possam comprometer-nos seja na carreira ou em outros aspectos da vida.

Sendo assim no presente artigo trataremos das falácias do tipo 'indutivas' segundo a classificação de Stephen Downes*.

Um grande jornal lançou há muitos anos uma interessante campanha cuja ideia era de que falando apenas verdades podemos contar uma grande mentira. Pois bem, é este o espírito das falácias indutivas, bastante utilizadas por jornais, agências de notícias, revistas, agências de marketing etc. O público de certos meios de comunicação, através de informações verdadeiras mas parciais ou cuidadosamente selecionadas, pode ser induzido a uma conclusão que não condiz com a realidade. Pode-se, por exemplo, induzir os leitores a considerar uma pessoa corrupta selecionando pontualmente notícias ruins sobre ela ou propagandear um produto com análises que descartem seus pontos negativos.

Falácias indutivas

O raciocínio indutivo consiste em inferir das propriedades de uma amostra para as propriedades de um elemento não pertencente à amostra ou para as propriedades da população como um todo. Traduzindo para um linguajar mais claro suponha que temos uma lata com 1000 feijões. Alguns são pretos e outros são brancos. Suponha agora que retiramos da lata uma amostra de 100 feijões e que 50 eram brancos e outros 50 eram pretos. Então, podemos inferir indutivamente que metade dos feijões da lata (500 feijões) são pretos e que a outra metade é branca.

Todo o raciocínio indutivo depende da semelhança entre a amostra e a população. Quanto maior for a semelhança entre a amostra e a população como um todo, maior validade terá a inferência indutiva. Por outro lado, se a amostra tiver diferenças relevantes face à população, então a inferência indutiva não será válida (No caso do exemplo acima um feijão não difere em quase nada de outro feijão e por isso a inferência pode ser feita).

Mesmo que as premissas de um raciocínio indutivo sejam verdadeiras, a conclusão pode ser falsa. Apesar disso, uma boa inferência indutiva dá-nos uma boa razão para pensar que a conclusão é verdadeira.

Generalização Precipitada

A amostra é demasiado limitada e é usada apenas para apoiar uma conclusão tendenciosa.

Exemplos:

  • Fred, o australiano, roubou a minha carteira. Portanto, os Australianos são ladrões. (Claro que não devemos julgar os Australianos com base em um exemplo.)
  • Perguntei a seis dos meus amigos o que eles pensavam das novas restrições ao consumo e eles concordaram em que se trata de uma boa ideia. Portanto as novas restrições são populares.
  • Print de um tweet falando sobre a absurda teoria da Terra Plana
    Post no Twitter defendendo a teoria da 'Terra Plana'

    O post acima defende a teoria da 'Terra Plana' baseada em uma única informação descontextualizada.

Amostra limitada

Há diferenças relevantes entre a amostra usada na inferência indutiva e a população como um todo

Exemplos:

  • Para ver como os brasileiros vão votar na próxima eleição sondou-se uma centena de pessoas em São Paulo. Isto mostra, sem dúvida, que a direita vai ganhar as eleições. (As pessoas de São Paulo tendem a ser mais conservadoras e, portanto, mais propensas a votar em partidos de direita do que as outras pessoas no resto do país.)
  • As maçãs do topo da caixa parecem boas. Todas as maçãs desta caixa devem ser boas. (As maçãs com bicho, claro, estão em camadas mais fundas...)

Falsa analogia

Numa analogia mostra-se, primeiro, que dois objetos, (a) e (b), são semelhantes em algumas das suas propriedades, F, G, H. Conclui-se, depois, que como (a) tem a propriedade E, então (b) também deve ter a propriedade E. A analogia falha quando os dois objetos, (a) e (b), diferem de tal modo que isso possa afetar o fato de ambos terem a propriedade E. Diz-se, neste caso, que a analogia não teve em conta diferenças relevantes.

Exemplos:

  • Os empregados são como pregos. Temos de martelar a cabeça dos pregos para estes desempenharem a sua função. O mesmo ocorre com os empregados.
  • Governar um país é como gerir uma empresa. Assim, como a gestão de uma empresa responde unicamente ao lucro dos seus acionistas, o governo também deve fazer o mesmo. (Mas os objetivos do governo e da gestão de uma empresa são muito diferentes; assim, provavelmente têm de encontrar critérios diferentes.)

Indução preguiçosa

A conclusão apropriada de um argumento indutivo é negada apesar dos dados.

Exemplos:

  • Hugo teve doze acidentes nos últimos 6 meses. No entanto, ele continua a dizer que se trata de coincidência e não de culpa sua. (Indutivamente, as provas apontam irresistivelmente para a culpa de Hugo.)
  • Sondagens e mais sondagens mostram que o partido ABC ganhará menos de 10 lugares na câmara. Apesar disso o líder do partido insiste em que o partido terá muito mais votos do que as sondagens sugerem. ( De fato o partido ABC só obteve 9 lugares.)

Omissão de dados

Dados importantes, que arruinariam um argumento indutivo, são excluídos. A exigência de que toda a informação relevante e disponível seja incluída num argumento indutivo, é chamada "princípio da informação total".

Exemplos:

  • O João é carioca, e a maioria dos alentejanos vota no ABC, portanto o João provavelmente votará no ABC. (A informação deixada de fora é que o João vive em Copacabana e a maioria dos que vivem lá vota XYZ.)
  • Muito provavelmente o Corinthians vai ganhar este jogo porque ganhou nove dos últimos dez jogos. (Oito das vitórias foram obtidas sobre equipes de divisões inferiores, na fase de preparação, e o Corinthians vai agora enfrentar uma equipa de primeira divisão.)
  • Imagem de um post no Twitter da agência de checagem Aos Fatos com um mapa estilizado do Brasil feito com quadrados amarelos
    Post no Twitter da agência de checagem Aos Fatos.

    A agência de checagem de fatos Aos Fatos mostra que os dados para a afirmação acima eram incompletos.

* Esta classificação ou o nome utilizado pode variar dependendo do autor

Referência(s)

Guia das falácias de Stephen Downes - Tradução e adaptação para Português de Portugal de Júlio Sameiro - Aclimatação para o Português do Brasil de Ibrahim Cesar

Autor(a)

Equipe Ser Melhor

Contato

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